Neste roteiro, a arte do vidro e da guerra
30/11/2022| Batalha, Marinha Grande| CIMRL
Marinha Grande / Batalha
Nesta sugestão de dois dias, começa o dia com uma visita ao Museu do Vidro, na Marinha Grande. Aprende como surgiu essa matéria moldada a mais de dois mil graus de temperatura, a partir da areia e da sílica, e que vem do tempo dos egípcios e fenícios. Marquês de Pombal reuniu as condições para que Guilherme Stephens transformasse a antiga Real Fábrica de Vidros da Marinha Grande num polo de desenvolvimento. Neste espaço dedicado às artes decorativas do vidro, bem como à tecnologia de produção de vidro utilitário e científico, é possível viajar no tempo e ficar a saber um pouco mais sobre uma indústria que ainda hoje dá cartas. É na Marinha Grande, por exemplo, que são produzidas as garrafas de algumas das cervejas mais consumidas no país.
No museu, as peças estão dispostas nos dois pisos do palacete. Destaque para o grande salão onde o lustre composto por mais de mil peças presenciou jantares e festas sumptuosas ao som de músicos exímios, instalados no segundo andar, reservado aos empregados. Ao centro, a garrafa de seis vinhos atrai os visitantes pela complexidade da confeção, mas também pela beleza do trabalho do vidro.
Para os mais saudosos, é possível ver ainda expostas garrafas que foram ícones de gerações como a famosa orangina ou a garrafa dos pirolitos.
Depois, não há nada como ver ao vivo, muito do que se aprendeu nos expositores do museu. Basta atravessar a rua e visitar o atelier de Alfredo Poeiras, o artesão que ainda hoje trabalha com vidro soprado. Mas, regra geral, as portas só estão abertas em abril, agosto ou dezembro.
No mesmo edifício da resinagem está ainda patente uma exposição que dará lugar ao futuro museu dos moldes. Com o vidro a entrar em declínio Aníbal H. Abrantes foi beber o que de melhor se fazia pela Europa. Regressou com a ideia dos moldes para plástico. Mas o irmão e sócio, Aires Roque, não quis arriscar e optou por vender a posição na empresa. Dois anos mais tarde, Abrantes produziu o primeiro molde de injeção para plástico. Foi com brinquedos que Portugal viu nascer aquela que é hoje uma das principais indústrias exportadoras do país. A sua importância é tão grande que lhe será dedicado um museu. Uma dica, repara bem no molde da boneca que parece mexer quando vista através do telemóvel. Faz a experiência por ti.
O núcleo de arte contemporânea do Museu do Vidro está num moderno edifício adjacente, todo em vidro e metal. Aqui podes ver diferentes peças, dos mais variados autores, nacionais e estrangeiros. Entre peças convencionais, excêntricas e surpreendentes o ator principal é sempre o vidro.
Terminadas as visitas é tempo de saborear uma substancial sopa do vidreiro e rumar para o litoral. A meio da tarde, depois de uns bons banhos de mar e de retemperar forças ao sol, assiste ao retirar das redes de uma das companhas na praia da Vieira. Prepara-te para a azáfama dos homens, que desafiam a força da natureza e arrancam das profundezas do mar uma das suas maiores riquezas – o peixe. Sardinhas, carapaus, robalos. As redes prendem nas malhas centenas de exemplares que, a trepidar de frescura e vigor, se tentam soltar a todo o custo. Mas o destino está traçado: a lota mesmo no topo da praia onde chegam ainda a mexer.
As dezenas de curiosos que se alinham para admirar esta arte ancestral não se podem descuidar porque o vaivém dos tratores, que substituíram os bois no puxar das redes, é incansável. Com uma agilidade surpreendente e uma mestria invejável, em pouco mais de uma hora as redes estão de nova arrumadas e prontas para a próxima faina.
Nada melhor do que terminar o dia com um belo peixe grelhado ou um generoso arroz de marisco da praia da Vieira – que até já foi eleito uma das sete maravilhas de Portugal. Das mãos da Dona Leopoldina, no Solemar (mas que todos conhecem por Coelho), sai um arroz de comer e chorar por mais. Na verdade, não é preciso chorar porque as doses são tão generosas que requerem reforços para dar conta dos pedaços de lagosta, camarão e ameijoa envoltos num arroz aromático e caldoso. No ponto. Mas na Vieira há muitas outras opções de restaurantes. É só escolher.
O melhor seria voltar para o hotel de bicicleta, para aproveitar os quilómetros de ciclovias que existem por estas paragens. Mas guardemos o exercício físico para o dia seguinte.
Batalha – Pia do Urso
A apenas a 25 minutos de carro da Marinha Grande, a Batalha tem um mundo de opções para ver e fazer. A ordem do passeio fica a teu gosto.
Mas fica com esta sugestão: leva calçado confortável e bom para caminhadas.
Podes começar, por exemplo, no Buraco Roto – já a caminho de Porto de Mós. Uma falha no maciço calcário que, em momentos de água abundante, dá origem a uma cascata. É uma verdadeira maravilha da natureza. Não existem muitas indicações, por isso garante que sabes ir dar ao local certo. Como existem diversos trilhos pedestres, poderás obter indicações contraditórias. E, neste caso, a internet também não é grande ajuda, porque há tanta gente a publicar fotos erradas do local que é possível passar por ele sem te aperceberes (sobretudo se o tempo estiver seco e não houver queda de água). Mas vale a pena, nem que seja pelo passeio na natureza e para admirar as formas incríveis que as pedras assumem fruto da ação das águas, ano após ano. Mas procura a Rua dos Faiais, no Reguengo do Fetal e nestas coordenadas (39.640315, -8.760513) tens de parar o carro e seguir um pequeno percurso a pé. O fenómeno geológico é mais atrativo no inverno, pois escorre água abundante, mas mesmo com o tempo seco merece uma visita para ficar com a foto do buraco roto.
Seguindo caminho, em direção à Pia do Urso – uma aldeia, onde ainda vivem algumas famílias, totalmente recuperada serve de preâmbulo a um ecoparque sensorial pensado também para invisuais. Acima de tudo é um trilho pedestre com várias estações interativas e lúdicas que fazem as delícias das crianças, mas também com as várias formações geológicas – as pias – onde os ursos iam beber água. E nem falta o urso que faz a alegria dos petizes e personifica a lenda que deu origem ao lugar.
Há jogos de sons e de reciclagem e é possível observar vestígios das vias romanas que conduziam a Olisipo (Lisboa) e Collipo (Batalha/Leiria). Um trilho que D. Nuno Álvares Pereira e as suas tropas terão certamente percorrido a caminho da famosa batalha de Aljubarrota (1385), tal como as tropas invasoras de Napoleão, quase 500 anos depois. Mas já lá vamos, à histórica riquíssima da Batalha. Primeiro almoçar. Se a tua preferência são os piqueniques, na entrada sul tens um belo parque de merendas. Em alternativa tens, alguns metros abaixo, o restaurante Piadussa a funcionar para almoços e jantares. Iguarias deliciosas não faltam.
A caminho deste local ficam as grutas de São Mamede (conhecidas como Grutas da Moeda, que devem o nome à lenda que conta que um ladrão deixou cair no algar uma bolsa cheia de moedas que tinha roubado) que merecem uma visita guiada para ver as formações moldadas pela água ao longo dos séculos. Aproveita também para uma passagem pelo Centro de Interpretação das Grutas da Moeda onde podes ficar a conhecer um pouco melhor as várias formações calcárias.
E como o tempo não pára, nada de sestas. Corre para o mosteiro e deslumbra-te com as cores que os vitrais emprestam às pedras seculares. O jogo de cores que os vitrais imprimem nas pedras do interior do Mosteiro levam os amantes de fotografia a passar horas à espera do momento certo para fotografar. Ao longo do ano o sol reflete de forma diferente nos vidros coloridos e é difícil saber a que horas a luz vai colorir a pedra branca. O Mosteiro de Santa Maria da Vitória, tal como o nome indica, foi erguido para comemorar a vitória militar sobre as tropas de Castela a 14 de agosto de 1385. A famosa batalha de Aljubarrota e a inovadora técnica do quadrado projetaram D. Nuno Álvares Pereira para o estrelato da época.
O Mosteiro é o resultado da promessa de D. João I à virgem na véspera da batalha. Conta a lenda que durante a luta disparou uma flecha e onde calhasse seria o local escolhido para o complexo que é o “grande monumento do gótico tardio português e o berço do estilo manuelino”.
As histórias, lendas e episódios em torno do mosteiro são infindáveis. Desde as capelas imperfeitas, sem teto porque o dinheiro não chegou (foi necessário para os Jerónimos), aos estragos provocados pelo terramoto de 1755 e depois pelas invasões francesas – é visível ainda uma mancha escura numa das paredes provocada pelas escaramuças –, passando pela Capela do Fundador, o Claustro de D. João I, ou até o relógio mecânico encomendado por D. Afonso V… Mas não podes falhar o render da guarda na Sala do Capítulo onde estão sepultados dois soldados desconhecidos – um vindo da Flandres (I Guerra Mundial) e outro da África colonial – e o Cristo das Trincheiras que esteve mesmo em vários campos de batalha. O problema será gerir o tempo e poderás ter de prolongar a estadia ou planear uma visita para três dias e talvez conjugar com uma ida a Porto de Mós.
Na cidade podes ainda ver a Igreja da Misericórdia, do século XVIII (estilo barroco), a Ponte do Boutaca, um viaduto da segunda metade do século XIX, construído em estilo revivalista e traço neogótico, ou ainda o pelourinho que não é original, mas uma réplica porque no Estado Novo se decidiu criar os espaços amplos em torno do mosteiro, que ainda hoje existem, mas que sacrificaram o casario e não só.
Mas não podes ir embora sem algo doce para recordar estes dois dias – as cavacas de Reguengo do Fetal. Mas é possível que não as encontres, porque são típicas das festas em nome da Senhora do Fetal cujo ponto alto são as procissões noturnas iluminadas por velas feitas de cascas de caracóis. Um evento que tem lugar em setembro e outubro. Mas pode ser que tenhas sorte…
E claro, podes sempre voltar uma próxima vez para tentar de novo.
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